quinta-feira, 1 de dezembro de 2011

SENTIMENTO DE UM OBIDENSE XUPA OSSO SOBRE A DIVISÃO DO PARA: PORQUE NÃO TENTAR?

Era dezembro de 1974. Minha mãe e meus cinco irmãos já estavam em Santarém ajudando minha querida avó a embalar sua mudança, pois embarcaria, no dia 27 do mesmo mês, em caráter definitivo, para Belém-Pa.

Eu, ainda moleque, permanecia em Óbidos na companhia de meu pai, desfrutando os últimos dias na minha querida Cidade-Presépio. Na cabeça daquele moleque existia uma confusão sem tamanho, pois meu pai queria que eu estudasse, meu avô sonhava em ver-me trajando a farda da Marinha do Brasil e eu só pensava na decisão do campeonato obidense que, atrasado, só aconteceria em janeiro de 1975.

O Mariano era um timaço: De Monte, Luiz Canela, Valdelino, Negão e Paulinho Pirão; Viola, Luiz Carlos e Crízio; Merunga, Celson e Bicho. O time do Santos também era uma “máquina”: Paulo Cardoso, Cutite, Cacão, Barata e Cubiu; Zé Pitiu, Cobra e Pacu; Roja, Leme e Maniva. Porém, infelizmente, o martelo já tinha sido batido e eu não poderia ver o jogo final.
 
Chegou a hora de pensar na vida... Precisas estudar! Disse meu pai.

E foi assim que a minha infância teve fim. Viajamos, eu e meu pai, na véspera do natal, para participarmos da ceia em família. Até ai tudo bem, mas no dia 26 de dezembro eu recebi o meu pior presente de natal: Assisti o Barco Motor “Rio Idequel” se afastar do porto de Santarém, na frente do Bar Mascote, levando meu pai, minha mãe e meus irmãos. E pela primeira vez na vida eu fui obrigado a chorar pra dentro. Não conheço dor maior!

Chorei calado, porque se alguém percebesse minha tristeza poderia ser muito pior e, além da frustração, eu ainda teria que ouvir os mesmos argumentos – todos carregados de razão:
 
Todo jovem precisa estudar. Isso é indispensável para a vida...

E eu me perguntava: - Por que não na minha terra?...

É claro que eu já sabia a resposta, afinal, todos sabiam que o estudo era “fraco”.

Para mim sobraram as lágrimas. Confesso que não sei onde as encontrei com tanta abundância, naquela noite. Chorei até cansar!

No dia seguinte o moleque foi-se, no navio Leopoldo Peres, curtindo a beleza da viagem na primeira classe. Curioso, resolveu “abelhudar” a bagunça generalizada que existia na terceira classe, onde observou gaiolas de patos por cima de paneiros com farinha, caixas com mangas, muitas redes e imundice pra todo lado. A única coisa boa daquele setor era o papo animado.

A viagem foi ótima. O navio apontou às 19 horas do dia 31/12/74 em frente a Belém. Assim, pude ver pela primeira vez na vida uma enorme quantidade de foguete estourando para todos os lados. Pouco entendia sobre festas de réveillon, pois no meu mundo, em Óbidos, a notícia era apensa sobre a existência de um baile onde se ouvia a meia-noite, a execução do Hino Nacional.

Os primeiros meses longe de casa foram difíceis, agravado por uma notícia que li no jornal “A Província do Pará”: Santos – o novo Campeão Obidense! Eu sempre chorava e esperava a noite de sexta-feira chegar para ligar o rádio na PRC-5 - Rádio Clube do Pará, através do qual curtia o programa do “Regatão” por saber que naquele momento minha família também o ouvia no sítio “Retiro da Fonte". Era fácil imaginar os comentários do meu pai com relação às brincadeiras do programa e esse era o meu jeito de matar a saudade. Depois, desligava o rádio e ouvia os sambas divinamente executados na casa de Show “Renasci”, que fazia fundos com o quintal da casa do meu avô.

E assim se passaram 16 anos da minha vida. Com certeza valeu a pena, apesar da ferida nunca ter cicatrizado. Longe de casa cai, levantei, bati, apanhei, tropecei e me aprumei. Enfim, varei!

A Belém, cidade que adoro, só tenho a agradecer. Hoje sou devoto de Nossa Senhora de Nazaré, me alegro e sofro com o meu querido Papão da Curuzu e adoro as tardes de sábado do Bar do Gilson. De coração, eu sou grato a tudo que Belém me proporcionou e tenho consciência que devo muito a essa terra. Recordo, com saudade, as noites do Rancho, o fim de noite no Ver o Peso, o Bar do Parque, as madrugadas no Lapinha e agradeço a cada meretriz que comigo dançou na juventude da minha vida.

Trinta e sete anos se passaram e o estudo na minha querida Óbidos continua fraco. Precisarei, por isso, assistir um barco partir levando minha filha de 12 anos para adquirir conhecimentos que lhe permitam disputar um espaço no mercado de trabalho, hoje tão competitivo e mais técnico.

Confesso que por essa eu não esperava - repetir o mesmo drama, com o papel invertido, pois hoje estou chorando as lágrimas que chorou meu pai. Gostaria muito que ele tivesse explicado como é a dor deste lado, pois até o presente momento só encontrei a mesma saída: chorar...

Sei que minha filha estará em boas mãos, porque os tios e primos que a acolherão, são maravilhoso. Porém, sinceramente, não sei como me comportarei olhando para sua cama vazia, sem suas gargalhadas, sem o seu cheiro e peço-lhe desculpas por não poder fazer diferente.

A única coisa que eu sei é que esse é o preço que pagamos por ter escolhido Óbidos para viver.

Por minhas filhas já não posso fazer grande coisa e, infelizmente, também tenho que bater o mesmo martelo, embora sabendo que essa é uma forma de punir praticando o bem.

Pelos meus netos e por todos os obidenses da próxima geração, eu tentarei dar o direito de viver a juventude na companhia de seus pais. Para isso, VOTAREI SIM PELA DIVISÃO DO ESTADO DO MEU PARÁ e sei que muitos vão me perguntar:
 
Jorjão, e o que isso vai resolver?

Eu responderei:  Vão todos para a puta que os pariu!... Se pior não ficará, POR QUE NÃO TENTAR?

Jorge Ary Ferreira, paraense de Óbidos.

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