segunda-feira, 14 de novembro de 2011

SE APROVADO EM PLEBISCITO, CARAJÁS SERÁ O ESTADO DA VALE

Se o plebiscito marcado para o dia 11 de dezembro aprovar a divisão do Pará em três estados — Tapajós, Carajás e novo Pará — um deles, Carajás, nascerá à sombra da companhia Vale. Com uma população de 1,6 milhão de habitantes, o novo estado herdará as principais reservas minerais da empresa, entre elas a maior mina de minério de ferro do mundo, localizada na cidade de Parauapebas.

Se criado, Carajás ocupará a porção Sudeste do atual estado do Pará e terá 39 municípios. Em pelo menos 29, a Vale está presente. A mineradora tem investido bilhões de dólares nessa região nos últimos anos. Só este ano, foram US$ 5,1 bilhões.

Os investimentos têm impulsionado o crescimento econômico de algumas cidades para níveis chineses. Esse crescimento também acaba atraindo migrantes de cidades vizinhas e estados mais pobres do país em busca de empregos, agravando os problemas sociais.

A Vale não se manifesta sobre o plebiscito que pode fatiar o Pará. Mas economistas e políticos ouvidos pelo GLOBO afirmam que a empresa aumentará seu poder no novo estado. Seus principais negócios estarão concentrados em Carajás, um estado que será muito menor do que o Pará, e a companhia poderá exercer maior influência política sobre os municípios, dizem eles.

Além disso, Carajás terá direito a oito parlamentares na Câmara dos Deputados, além de três senadores, o que aumenta o raio de influência em Brasília.
 
A influência da Vale sobre o novo estado será enorme. Só o lucro da companhia em 2010, foi de R$ 30 bilhões, corresponde a mais de dez vezes o valor das receitas previstas para Carajás, que são de R$ 2,9 bilhões — diz o economista Josemir Gonçalves Nascimento,secretário-executivo da Associação dos Municípios do Araguaia, Tocantins e Carajás (Anamat), favorável à separação do Pará.

A cidade de Parauapebas é um exemplo de crescimento chinês provocado pela atividade da mineradora. Paraupebas cresceu 20% ao ano, em média, entre 2000 e 2010. Em duas décadas, a população cresceu 15 vezes e chega hoje a 150 mil pessoas. Nove entre dez migrantes vieram atraídos pela possibilidade de obter uma vaga nos cursos de qualificação patrocinados pela empresa e arrumar um emprego.

Nos últimos três meses, a Vale abriu 1,7 mil novas vagas. No ano, foram 9 mil novos empregos gerados nos canteiros de obras da empresa no Pará.

Calcula-se que 80% da economia de Parauapebas gire em torno da Vale. Na lista do Ministério do Desenvolvimento,Indústria e Comércio Exterior, a cidade aparece como a segunda maior exportadora do país, este ano. Foram US$ 8,7 bilhões obtidos com minerais.

Os sinais desse dinheiro gerado pela Vale são visíveis: Parauapebas é a única cidade do Sudeste do Pará a ter um shopping como o de grandes capitais. São quatro cinemas, 126 lojas e 700 vagas de estacionamento. Entre os clientes do empreendimento, estão os 10 mil funcionários da Valeque trabalham na cidade.
 
Temos 700 empresas associadas e todas têm negócios diretos ou indiretos com a Vale — diz José Rinaldo Alves de Carvalho, vice-presidente da Associação Comercial, Industrial e de Serviços de Parauapebas.

A estrada de ferro que escoa o minério de ferro e manganês extraídos em Parauapebas até o Terminal Marítimo de Ponta da Madeira, em São Luís, no Maranhão, também é controlada pela Vale. A ferrovia virou uma espécie de moeda de troca entre a empresa e os índios e sem-terra que vivem na região. Sempre que querem aumentar o valor que a mineradora paga por usar terras indígenas em Marabá, os índios bloqueiam a ferrovia.

No início deste ano, eles fizeram sete funcionários da companhia reféns. Os sem-terra também já bloquearam a estrada de ferro pedindo maior assistência aos assentamentos rurais da região, uma reivindicação que deveria ser feita ao governo do estado ou à União.

É também à Vale que recorrem prefeitos que precisam construir novas delegacias, escolas, postos de saúde e pavimentar estradas. A Prefeitura de Parauapebas, por exemplo, cobra uma universidade federal da Vale.
 
O braço do governo não chega até aqui e a Vale acaba sendo o alvo das reivindicações. Além disso, a companhia também é fonte de recursos para muitos municípios, que recebem os royalties da mineração — diz o deputado federal Giovanni Queiroz (PDT-PA), coordenador da Frente pela Criação do Estado de Carajás e um dos nomes cotados para ser candidato a governador do novo estado.

Como a Vale não paga ICMS ao estado pelo minério extraído, a contrapartida da empresa é muito menor do que poderia ser aos municípios, diz um empresário da região que prefere não se identificar.
 
 A Vale faz apenas ações isoladas, sempre que há pressão de prefeitos e da população. É uma ajuda muito pequena para o volume de negócios da empresa na região — diz o empresário.

A 200 quilômetros de Parauapebas está Marabá, cotada para ser a capital do novo estado de Carajás. Na cidade, a Vale também mostra seu poder econômico. A mineradora está construindo uma siderúrgica no município. A Aços Laminados do Pará (Alpa) terá inves timentos de US$ 3,2 bilhões e deve começar a funcionar em 2014, produzindo 2,5 milhões de toneladas de placas de aço.

O objetivo da Vale é transformar parte do minério de ferro extraído das minas de Parauapebas em aço em Marabá, agregando valor ao produto. O impacto da siderúrgica será enorme na cidade. Além da usina em si, o empreendimento prevê a construção de um acesso ferroviário para receber o minério de ferro de Carajás. Também será construído um terminal fluvial no Rio Tocantins para receber o carvão mineral e fazer o escoamento da produção siderúrgica até o terminal Portuário de Vila do Conde, em Barcarena. Além da siderúrgica, a futura hidrovia deverá servir a outras atividades econômicas da região.
 
 A siderúrgica da Vale em Marabá já está provocando uma onda de investimentos no entorno da cidade — diz o economista Josemir Gonçalves.

Se a Vale terá influência positiva no novo estado, ela também é apontada como fonte de problemas para Carajás. Cada projeto implantado pela mineradora representa o aumento da migração para a região. A construção de um ramal ferroviário da Vale saindo de Canaã dos Carajás e passando por Parauapebas, por exemplo, deve atrair 3,6 mil pessoas para trabalhar. Mas apenas 600 vão continuar empregadas após a conclusão da obra, que deve levar três anos. O novo ramal também vai escoar a produção da Vale.
 
É preciso criar infraestrutura de serviços públicos, como educação, saúde, além de moradias. E também novas oportunidades de emprego que não estejam ligadas à Vale são necessárias. A divisão do Pará em três estados (Tapajós, Carajás e novo Pará) também é importante no sentido de tornar o poder público mais atuante nessas regiões — diz o deputado Queiroz.

GLOBO.COM

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